sexta-feira, 23 de março de 2007

Como mensurar a cristandade?

Uma das questões que mais afligem o público do white metal é saber se tal banda é ou não é cristã. Diria mais: há uma incessante busca na tentativa de abarcar novos grupos sob o domínio do estilo. De Ministry a After Forever, de Pain Of Salvation a Balance Of Power, de Ayreon a Savatage, de Shadow Gallery a Symphony X, os exemplos são inúmeros (e muitas vezes absurdos) de bandas que já estiveram "sob suspeita".

Por Maurício Gomes Angelo

Boa parte dos emails que recebo são do tipo "Maurício, gosto muito desse e daquele grupo, mas tenho dúvidas se eles são mesmo cristãos ou não, pode me ajudar?". Ora, quem sou eu para definir a crença de alguém? Posso, no máximo, indicar quem se deixa colocar, sem problemas, na baila de bandas cristãs. E, afinal de contas, como mensurar a cristandade? Como chegar a um veredicto sobre a "confiabilidade doutrinária" de alguma agremiação musical?

O senso comum diz que a diferença principal entre bandas de white metal e as outras são as letras. Pratica-se o mesmo tipo de som (lembrando que o white congrega todas as vertentes) com o detalhe de que o conteúdo lírico é de cunho cristão e bíblico. Seria uma forma simples de definir. Contudo, letras são muitas vezes subjetivas, e, por excelência, caem na inevitável superficialidade. Também há inúmeros temas a abordar que não a religião ou a crença. Com isso, temos, invariavelmente, bandas tendo que explicar "o que queriam dizer em tal passagem". Há um farisaísmo excessivo neste aspecto, ou seja, o público exige uma cristandade cada vez maior e principalmente, uma onipresença do tema. Um quer ser mais cristão que o outro, ou parecer que é, o que acaba gerando vários problemas.

Mas a questão não pára por aí. Além das letras, o público quer saber se as bandas bebem, fumam, se ouvem grupos seculares, que igreja freqüentam, qual os pormenores de suas crenças, quantas pessoas converteram no último mês, se praticam sexo fora do casamento, sua opinião sobre o aborto e por aí vai. Parece-me que foi imputada uma cartilha do "como ser uma (indiscutível) banda cristã". A curiosidade, e a obsessão por pureza, vão muito além do saudável e necessário.

O problema desdobra-se em outros pontos. Por exemplo, considerável parte das bandas não são constituídas apenas por integrantes cristãos, há um que é, outro que não é, e assim por diante. Imagine as concessões internas que se tem que abrir para manter a harmonia do conjunto. E claro, não só nas cristãs isto acontece, mas em todas as outras, pelos mais variados motivos possíveis. Ou seja, entenda "divergências musicais", a frase máxima usada para explicar a expulsão de algum integrante, como quase tudo que você puder imaginar. Desde participação nos lucros, aparecimento na mídia, performance no palco, pontualidade nos compromissos até ritos particulares que ultrapassam o ridículo.

Outra abordagem possível é a inegável carência de estilos que o white metal tem. Por exemplo, grande parte das bandas que, inexplicavelmente, acabam tendo sua cristandade verificada, são de progressivo. Na verdade, empenha-se um esforço, desnecessário diga-se, para colocar este ou aquele nome como "apreciável" por parte dos white metallers. Claro que nisso está implícito uma absolvição forçada de culpa por parte dos ouvintes, já que, "se aquela banda for mesmo cristã" eu "poderei ouvi-la sem problema nenhum". Tenta-se resolver um problema criando outro.

Acho que tudo isso é errôneo e cansativo. Não há necessidade em se imputar o rótulo de cristã a alguma banda. Tem-se, pelo contrário, que compreender a individualidade de cada um. E, além do mais, a crença de alguém não é algo que se perde com tanta facilidade, não depende da quantidade de letras bíblicas em cada álbum, nas vezes que se falou em Jesus em cada entrevista. Resumir a questão em coisas tão pequenas e ordinárias demonstra uma falta de maturidade gritante de ambas as partes. Há, sim, que se produzir boa música e se manter coerente. Lembrando que a coerência inclui todas as indisposições, desvios e eventuais mudanças. Assim como a perfeição é composta de falhas. Mas já começo a entrar na filosofia, e isto é assunto para outra hora e outro lugar.

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Carta do Editor

Nesta edição temos uma interessante reflexão (que acaba servindo como apêndice do tema principal) do nosso amigo Andryo Dias, intitulada "White Metal, por que?". Falando nele, Andryo é o responsável pelo momento mais histórico da CV até agora: o review de show e a entrevista ao vivo com os membros do Petra, realizada em dezembro último, durante a turnê de despedida da banda. Ainda nos medalhões, confira as resenhas do dvd do Mortification e o aguardado relançamento do Whitecross. No âmbito nacional, temos entrevistas e reviews com duas bandas brasileiras lançando novos álbuns: Seven Angels e The Joke?. Por fim, a Unknown Voices com o Teramaze, e o nosso top 10 de metal cristão do ano passado. Respire fundo e aproveite. Abçs,

MGA

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White Metal, por que?

Por Andryo Dias

O termo me intriga desde muito tempo, quando o ouvi pela primeira vez. O meio cristão abrange, hoje, todos os estilos de música, desde o country e blues ao rock e heavy metal; desde o samba e pagode ao axé e frevo. Arte é expressão de sentimento. É soltar o que vem de dentro. No meio cristão, talvez por viverem diferentemente das demais pessoas, ou por terem se permitido uma transformação espiritual, ou simplesmente pela busca da expressão real e exata do artista pelo que sente, a atual diversidade ocasionou também o inevitável: a criação de novos estilos de música.

O preto: escuridão, sombriedade, noite, etc. O branco: paz, clareza, luz, etc. Todos gostamos de, em certos momentos, um pouco de paz. Mas por que tal paz não pode ser obtida à noite no silêncio e escuridão de um cemitério? Esta é apenas uma das muitas perguntas que seriam intrigantes ao categorizarmos cores. Será que assim não seria também com estes dois estilos: Black Metal e White Metal?

Black Metal. Vocais guturais, levada veloz, escudos e machados, etc. E White Metal? Bom, existem milhares de bandas cristãs com vocais guturais e levadas velozes, bem como, centenas de milhares de cristãos que curtem a cultura sombria sem levar em conta a ideologia satânica, inclusive eu. Que grande confusão! E as bandas cristãs de black metal? Como seriam? White Black Metal? Há algo de muito errado com este termo. Vendo como os skinheads e nazis andam com os black metallers, nota-se que bem poderia parecer uma banda black que prega a ideologia White Power.

Poderíamos então usar o termo Gospel? Não. O termo surgiu nos EUA para identificar "evangelho", entretanto, nos tempos atuais, emprega-se para definir as bandas de louvor & adoração, mais conhecidas no Brasil como "bandas evangélicas". Música gospel é David Quinlan, Renascer Praise, Michael W. Smith, Diante do Trono, Hillsong, etc. Mortification não é metal gospel. Ou é metal, ou é gospel. O que divulgamos nesta coluna é rock e metal cristão, ou seja, christian rock, christian metal, christian black metal, christian death metal, christian goth, christian hardcore, christian punk e assim por diante.

Afinal de contas, o nome desta coluna é Christian's Voice, e não White's Voice. Eu é que não estou afim de ser processado.

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